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Casamentos caíram para metade nos últimos 11 anos

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades e até uma instituição tão sólida como a família sofre as suas mudanças. A diminuição dos casamentos e o aumento dos divórcios são tendências evidentes e as famílias reconstituídas e núcleos familiares monoparentais deixaram de ser situações isoladas.


CASAMENTOS EM QUEDA-LIVRE

O casamento foi durante muitos anos sinónimo de constituir família, algo socialmente esperado e que fazia parte das tradições mais enraizadas da nossa cultura. Em 1995, foram celebrados na Lezíria e Médio Tejo 5404 casamentos, dez anos depois registaram-se menos 1230 e, em 2011, caíram para perto de metade. O ato civil parece estar a perder importância, assim como o ato religioso, com 45% dos casamentos celebrados também pela igreja católica, aos quais se deverão somar os casamentos selados em outras religiões – pouco mais do que um por município, anualmente.

 

Em 1995, a percentagem de casamentos católicos era de 62%. “Há meia dúzia de anos que se começou a notar uma quebra na nupcialidade e, a cada ano, se vai acentuando. Basta ver o registo de nascimento dos bebés. São quase todos fi lhos de pais solteiros, divorciados e em situações semelhantes”, explica o António Mendes, Conservador do Registo Civil de Santarém.

 

“A conjuntura económica associada aos valores da sociedade atual fazem com que as pessoas casem cada vez mais tarde. Essa é uma realidade insofismável e, por outro lado, também faz com que os casamentos diminuam de forma drástica”, acrescenta António Mendes que em 2012 viu apenas 197 processos de casamento (civis mais católicos) darem entrada na conservatória, em detrimento dos 208 registados em 2011. A tendência na região é assim para a diminuição gradual e acentuada, apenas contrariada pontualmente em poucos municípios, como Tomar que já tinha visto aumentar o número de casamento em 2011 e em 2012 registou mais 145 casamentos que no ano anterior (dados da Conservatória). Os Censos 2011 permitem-nos ainda saber que cada família ribatejana tem, em média, 1,4 fi lhos.

 

DIVÓRCIOS. Os divórcios são uma realidade que tem vindo a ganhar expressão ao longo dos anos e na qual pesa essencialmente a mudança
de mentalidades e valores adotados pela sociedade. Segundo a Pordata, em 2011, havia 74,2 divórcios por cada 100 casamentos em Portugal. Em 2000 eram apenas 30. Na Lezíria e Médio Tejo essa tendência também se verifica com um aumento de quase o dobro dos divórcios entre 2000 e 2011.

 

Com isto, os divórcios e os casamentos revelam estar a crescer a um ritmo semelhante mas em sentidos inversos. Voltando ao exemplo da cidade de Santarém, em 2012 registaram-se na Conservatória do Registo Civil 90 divórcios sem partilhas, número que, acrescentando os divórcios com partilhas, aos quais não tivemos acesso, deverá crescer substancialmente. Recorde-se que casamentos foram 197.

Com o número de divórcios a aumentar, dilata consequentemente o número de famílias monoparentais e reconstituídas.

 

FAMÍLIAS MONOPARENTAIS. Atualmente na região da Lezíria e Médio Tejo, 1 em cada 10 famílias são monoparentais, número para o qual tem contribuído o aumento dos casamentos dissolvidos pelo divórcio. O conceito de família monoparental tem sido definido pelos estudos sociológicos como um núcleo familiar com pai ou mãe sem cônjuge a viver com um ou mais fi lhos solteiros. A expressão começou a ser utilizada em França, na década de 70, por um grupo de sociólogas feministas que procuravam uma terminologia adequada para designar este tipo de famílias.

 

As situações de divórcio impõem que, quando existem filhos em comum, sejam definidas responsabilidades parentais em tribunal, a residência dos fi lhos e os direitos de visita de acordo com a disponibilidade dos pais e, tanto quanto possível, em comum acordo. Em 85% dos casos da região os fi lhos são entregues às mães, formando núcleos familiares femininos, e apenas 15% aos pais. A maior fatia destas famílias é constituída por encarregados de educação com idades entre os 30 e os 50 anos (44,5%). Quanto ao nível de escolaridade, 31% são pais com o 1º ciclo de escolaridade, equivalente ao 4º ano, e cerca de 20% com o nível secundário.

 

FAMÍLIAS RECONSTITUÍDAS. Outro tipo de famílias modernas são as famílias reconstituídas, que representam neste momento 2,6% das famílias, à semelhança da média nacional. Em 52% delas existem filhos não comuns.

 

 

Casamentos entre homossexuais no distrito

Os três casamentos entre mulheres e cinco entre homens realizaram-se em 7 dos 21 municípios abrangidos, são eles Vila Nova da Barquinha, Azambuja, Cartaxo, Salvaterra de Magos, Torres Novas, Benavente e Tomar, que registou o maior número com dois casamentos celebrados.

 

O primeiro foi o de José Carlos Henriques e Fernando Silva que recentemente contaram sua história num programa televisivo. O casal de meia-idade falou sobre a importância deste passo e dos problemas ao assumirem socialmente a sua sexualidade. “Sei que se eu for [morrer] primeiro, ele tem a vida mais segura, tem direito àquilo que é meu o que não aconteceria se não estivéssemos casados”, confessou Carlos.

 

Fernando afirma que a maior dificuldade foi a aceitação da esposa e dos filhos e o cônjuge, ex-GNR, viu a vida profi ssional mudar drasticamente. “Deviam julgar que a homossexualidade era uma doença e fui reformado compulsivamente por síndrome depressivo grave”, recorda. Juntos desde 2004, hoje vivem felizes e não sentem qualquer tipo de preconceitos.

 

Em 2006 o nosso jornal contou a história de Valdemar e Wladimir, um casal de homossexuais que encontrou em Dornes o lugar ideal para instalar uma unidade de turismo de habitação. Conheceram-se e casaram-se na Holanda, passo que à data não era permitido dar em Portugal. Foram bem acolhidos e a estranheza inicial deu lugar a um convívio saudável. Em fevereiro de 2011, Teresa Carvalho e Patrícia Almeida, capitã do destacamento da GNR de Santarém, foram as primeiras militares lésbicas a casar em Portugal e, até àquela data, em todo o mundo. Vanessa Alemão, de 29 anos, e Rita Batista, de 30, foram as primeiras mulheres a oficializar a sua união, no passado mês de agosto, no Cartaxo.

 

 

Crescer entre duas famílias:

Vera vive sozinha com os três fi lhos de 12, 10 e 8 anos

 

As famílias e as tradições atravessam momentos de mudança, que se fazem sentir não apenas na estrutura e nos desafios do dia-a-dia, mas de forma especial em momentos de evocação da família como é o Natal.


Luís, Nuno e Catarina têm um Natal diferente desde há cinco anos, quando os pais se separaram. Mas diferente não signifi ca pior. “Passámos a véspera de Natal em casa do pai, nunca passamos com a mãe porque ela está sempre a trabalhar. Ajudámos a fazer fritos com a família e recebemos prendas”, explica Luís, o mais velho dos irmãos, com 12 anos. Vera trabalha numa fábrica de bolos, em Santarém, e nesta altura do ano o volume de trabalho aumenta exponencialmente,
por isso, o pai tira uns dias e cuida dos filhos durante as férias.

Para além disso, Vera segue uma religião em que o Natal não é festejado, contudo não deixa de passar o dia 25 na companhia dos fi lhos e de o assinalar mesmo que seja apenas com um pormenor, como almoçar ou jantar fora. “Como não vivemos só um dia em 365 dias por ano, opto por lhes dar algumas prendas ao longo do ano ou compensá-los de uma outra forma porque são crianças que trabalham muito e merecem”, afirma.


Nuno, o filho do meio, teve a melhor classificação nas provas de aferição do 4º ano entre os alunos que englobavam o antigo agrupamento de Escolas D. João II, atualmente integrado no agrupamento Escolas Sá da Bandeira. Entrou para o 5º ano em setembro continua a ser um aluno com bons resultados, assim como Luís e a irmã Catarina que, no 3º ano, se orgulha da nota máxima a Matemática e Estudo do Meio. “Os meus filhos melhoraram muito após o divórcio, mesmo ao nível escolar, porque antes não existia uma estrutura familiar. Quando existe um divórcio não tem que haver acusações de parte a parte porque a culpa é sempre dos dois”, explica Vera. Durante o processo de divórcio fez questão de explicar aos fi lhos os porquês e de ser realista com eles. Confessa que o primeiro ano foi difícil para todos, mas hoje as crianças estão adaptadas e os pais perfeitamente coordenados na sua educação. “Nós decidimos tudo em comum, em relação aos nossos fi lhos, como por exemplo a prenda de Natal que o pai lhes deu, telefonou-me a perguntar se estava de acordo que eles recebessem um telemóvel. O que vejo hoje em dia é que os pais usam as crianças para atingir os adultos e, em vez de transformarem homens e mulheres para o futuro, criam bebés grandes porque vivem num jogo de cintura de fazer as vontades às crianças para que gostem mais deles e quando dão conta estragaram a sua educação e não os prepararam para a vida”, afi rma.

 

A educação dos meus filhos está mais meu cargo, mas sempre foi assim porque o pai tem mais difi culdade em repreender ou aplicar um castigo. O certo é que temos conseguido resultados assim”, acrescenta. Foi estipulado que os três fi lhos do casal, atualmente com 12, 10 e 8 anos, ficariam ao cuidado de Vera e passariam com o pai um fim de semana a cada quinze dias, no entanto, dão mais valor à estabilidade emocional dos fi lhos do que ao que foi determinado pelo tribunal. “Chegou a acontecer metê-los no carro em pijama e levá-los a casa do pai, porque notava que eles estavam com saudades. Levava-os para fazerem uma surpresa ao pai e lhe darem um beijo e depois disso fi cavam muito mais tranquilos. Não somos pais de 15 em 15 dias, somos pais diariamente”.

 

A tendência é de crescimento do número de famílias monoparentais e a história de Vera e os três fi lhos mostra que quando o casamento
não resulta o divórcio pode ser uma forma de dar às crianças um ambiente familiar sadio e não necessariamente um fator desestabilizador
na sua educação.

 

Vanessa Colaço

O Ribatejo

3 Janeiro 2012

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